Mesmo com o agronegócio ficando de fora do projeto de lei que regulamenta o mercado de crédito de carbono no Brasil, algumas propriedades rurais do Estado poderão ganhar com a medida, caso ela passe na Câmara dos Deputados e seja sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nesta semana, o projeto foi aprovado pelo Senado, mas vai impactar só a indústria, pois o agro, temendo-se ter muito carbono emitido para compensar, ficou para uma segunda etapa.
Propriedades do Estado poderão ter a ganhar, principalmente, as que têm reserva de mata acima do mínimo legal previsto no Código Florestal, as que têm o título de Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) ou as propriedades rurais que integram a cadeia de produção de celulose.
A explicação é do titular da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), Jaime Verruck. Mesmo acreditando que o agronegócio deveria ter permanecido no projeto de lei, uma vez que a decisão tem capacidade de prejudicar o País em questões mercadológicas, o setor poderá ser beneficiado em MS. “A questão dos produtores se certificarem e venderem esse crédito de carbono não é o problema [isso já ocorre no mercado voluntário]”.
O secretário destaca ainda que o produtor emissor poderia entrar com débito na nova conjuntura do mercado de carbono, tendo inclusive que pagar imediatamente, fazendo uma aquisição desse crédito no mercado. “Geraria um custo inicial para a agropecuária”, pondera.
Nesse sentido, o representante da Semadesc lembra que aqueles produtores que têm RPPNs e reserva legal adicional poderão continuar realizando a verificação e a validação. “Eles poderão vendê-lo, inclusive para a indústria. Aqueles produtores que são carbono negativo, que captam carbono, poderão continuar tanto no mercado voluntário como vendendo crédito para a indústria no mercado [regulamentado]. No caso desses produtores captadores de carbono, o que nós não teremos é a possibilidade de que eles tenham um custo imediatamente adicional”, afirma o secretário de Estado.
O mercado de carbono permite que empresas e organizações compensem as suas emissões de gases de efeito estufa fazendo aquisições de créditos gerados por projetos que promovem esta redução, buscando, assim, neutralizar suas emissões.
No País, as estimativas apontam para uma geração de receitas com créditos de carbono na casa dos US$120 bilhões até 2030, conforme aponta estudo da Câmara de Comércio Internacional (ICC). Como reflexo, a expectativa é de gerar 8,5 milhões de empregos até 2050 em todo o Brasil.
CELULOSE
No ramo da celulose, MS já conta com três fábricas em plena operação, todas no município de Três Lagoas, uma da Eldorado Brasil, com capacidade de produção de 1,8 milhão de toneladas de celulose por ano, e duas da Suzano, que produzem 3,25 milhões de toneladas por ano.
A cadeia de celulose, ao contrário do agronegócio, já entra nesse mercado. No caso, a maioria das empresas que atuam em Mato Grosso do Sul entra como captadora, segundo suas métricas, conforme apurou o Correio do Estado.
Eldorado, Suzano e Arauco já têm estrutura de metodologia própria para a aferição de captação e emissão de carbono. “Elas trabalham como carbono negativo”, informa Verruck.
Contudo, o titular da Semadesc pontua que o processo deve ser certificado, mas que, no âmbito do novo mercado de regulamentação de carbono, o segmento se enquadraria na indústria pela estrutura em que opera.
“Elas que são as proprietárias do próprio eucalipto, então, elas entram como indústria”, complementa.
A Suzano está com mais uma fábrica em construção, desta vez em Ribas do Rio Pardo, que será a maior planta industrial de celulose do mundo, produzindo 2,55 milhões toneladas por ano. O Estado também conta com florestas da Bracell, na região de Água Clara, e da Arauco, em Inocência.
REGULAMENTAÇÃO
Segundo a proposição aprovada pela Comissão de Meio Ambiente do Senado, os que reduzirem as próprias emissões poderão adquirir créditos e vendê-los a quem não cumprir suas cotas. O objetivo é incentivar a redução das emissões de carbono na atmosfera, atendendo a determinações da Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187, de 2009) e de acordos internacionais firmados pelo Brasil.
De acordo com o Projeto de Lei (PL) nº 412/2022, ficam sujeitas ao Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) empresas e pessoas físicas que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e) por ano. Esses operadores devem monitorar e informar suas emissões e remoções anuais de gases de efeito estufa. Quem emitir mais de 25 mil tCO2e por ano também deve comprovar o cumprimento de obrigações relacionadas à emissão de gases.
Um acordo foi firmado com a Frente Parlamentar da Agropecuária, que sugeriu emendas ao texto, em que foi adicionado um novo parágrafo que não considera a produção primária agropecuária como atividade, fonte ou instalação regulada e submetida ao SBCE. Outro dispositivo aprovado retira do sistema as emissões indiretas decorrentes da produção de insumos ou de matérias-primas agropecuárias.
“O agro neste momento é excluído. Fizemos um acordo que foi integralmente cumprido. Já estamos trabalhando para que o agro tenha suas métricas e possa estar nesse mercado em breve, mas com segurança e com as nossas métricas”, disse a senadora Tereza Cristina (PP), membro da bancada ruralista.
TRANSIÇÃO
De acordo com a Agência Senado, o projeto de lei estabelece um prazo transitório para a entrada em vigor das regras relacionadas ao SBCE. Conforme o texto, o órgão gestor terá até dois anos para regulamentar o sistema. Depois de feita a regulamentação, os operadores terão mais dois anos antes de serem obrigados a conciliar suas metas – dentro desse prazo, devem apenas apresentar planos e relatos de emissões.
O descumprimento das regras do SBCE pode ainda acarretar punições, como multa de até R$ 5 milhões ou 5% do faturamento bruto da empresa. Um ato do órgão gestor do SBCE vai definir as infrações puníveis.